Standard Operating Procedures (SOP) são um documento que descreve as ações a serem executadas e checadas (uso de checklist) pelo(s) tripulante(s) para operar uma aeronave nas diferentes fases de voo. É basicamente um manual que detalha a sequência em que tudo deve ser feito, da forma mais eficaz e eficiente possível para melhorar a distribuição da carga de trabalho e evitar erros.
Os SOPs podem ser criados pelos fabricantes ou desenvolvidos/adaptados por seus operadores.
No caso de operadores certificados para realizar transporte público de passageiros segundo os RBAC’s 121 ou 135, ter um manual SOP é obrigatório.
Nas operações de aeronaves particulares (regidas pelo RBAC 91) a publicação de um SOP acaba ficando sujeita ao fabricante da aeronave utilizada. Para os casos em que a aeronave não tenha um SOP do fabricante, o operador poderá se basear no POH ou AFM para criar um a seu critério.
Portanto, na maioria das vezes o uso de SOP acaba sendo uma realidade apenas em aeronaves TIPO, ou seja, aquelas em que é necessário realizar treinamento em Centro de Treinamento certificado com uso de simulador.
Poderíamos dizer que os riscos operacionais são maiores na rotina das aeronaves particulares, pois o SOP não é exigido para voar um monomotor pistão, por exemplo. Infelizmente mesmo em operações onde o SOP é exigido, pessoas acabam cometendo violações e não cumprem com os procedimentos padronizados publicados por seu empregador.
As consequências de não cumprir procedimentos que foram planejados, testados e demonstrados pelos fabricantes e empresas, que são revistos e melhorados continuamente ao longo do tempo, não demandam mentes geniais para serem imaginadas…
Trazendo alguns números para nossa reflexão, de acordo com a Flight Safety Foundation (FSF) os fatores causais para acidentes em aproximação e pouso entre 1998 e 1999 relacionados a SOP foram:
- Omissão de ação ou ação inapropriada (à luz do SOP): 72% dos eventos
- Não aderência aos critérios para aproximação estabilizada: 66% dos eventos
- Coordenação, cheque cruzado e suporte inadequado entre os tripulantes 63% dos eventos
- Consciência situacional horizontal ou vertical insuficiente: 52% dos eventos
- Ação lenta ou retardada: 45% dos eventos
- Deliberado descumprimento dos procedimentos: 40% dos eventos
- Ausência de arremetida quando requerido: 17% dos eventos
Com isso, entramos no primeiro motivo para você estudar e seguir um SOP na sua operação: a segurança.
SOP’s aumentam a segurança operacional porque determinam parâmetros para as situações em voo, tirando do piloto a necessidade de determinar se uma situação poderá aumentar o risco e levar a consequências indesejáveis. Um excelente exemplo disso são os parâmetros de aproximação estabilizada. Ao estar em uma final visual e a aeronave começar a descer com uma razão de descida de 1.500 pés por minuto estando a 800 pés acima do terreno, você deve arremeter. Simples assim, sem pensar.
Claro que isso nos faz perceber um dos grandes motivos para muita gente “fugir” do SOP, os procedimentos parecem conservadores demais. Indo além nessa filosofia, não demora pra alguém levantar a mão pra dizer que SOP é coisa pra “manicaca”.
O que essas pessoas se esquecem é que os SOP’s não foram escritos apenas com base em teoria ou no design do cockpit de cada avião. Esses documentos e padronizações evoluíram com base em ocorrências e erros de fabricantes e operadores e foram sendo ajustados para evitar que ocorrências se repetissem.
O segundo motivo para você seguir o SOP é: manter seu emprego
A aviação tem acelerado cada vez mais a difusão das ferramentas de qualidade. Você já deve ter ouvido falar em Flight Operations Quality Assurance (Garantia de Qualidade em Operacoes de Voo – o FOQA), nos Quality Assurance Programs (Programas de Garantia da Qualidade) e em outras ações que buscam complementar o trabalho do Sistema de Gestão da Segurança Operacional em reduzir riscos e garantir a melhoria contínua dos operadores.
Repare bem na frequência do uso da palavra GARANTIA. Todos estão buscando formas para ter certeza de que cada um cumpra exatamente o que está determinado como sua responsabilidade e função. Portanto, violações se não tiverem um acidente como consequência terão outro tipo de responsabilização civil ou penal.
Devido a acidentes ocorridos ao longo do tempo por erros de ações, a aviação se tornou até um pouco engessada por procedimentos e manuais. Lembre do exemplo do caso do comandante Sully, que teve que se explicar muito porque acionou a APU do seu A320 antes do momento previsto no checklist mesmo tendo salvo todos a bordo após perder empuxo nos dois motores.
O fato é que independentemente de acharmos isso “chato”, se seguirmos os procedimentos, não teremos um acidente como consequência da operação. É por isso que operadores, agências reguladoras e seguradoras, têm criado tantos mecanismos para determinar e controlar as ações de tripulantes.
Terceiro motivo: fazer as coisas sempre do mesmo jeito cria memória muscular
Até ao dirigir um carro é mais fácil e seguro estabelecer “flows” (sequências de ações) para evitar problemas. Por exemplo, antes de começar a movimentar o carro você em uma única passada de olho rapidamente:
- Verifica o retrovisor esquerdo identificando se não há obstaculos, pedestres ou outros veículos com os quais poderia colidir;
- Liga o interruptor dos faróis para que todos vejam que seu carro está ligado e vai se movimentar, facilitando a visualização por todos seja à noite ou sob um sol forte;
- Aciona a seta para indicar que vai sair;
- Pressiona a embreagem e/ou pedal do freio preparando-se para engatar uma marcha;
- Verifica se no painel você tem indicação de combustível para o trajeto que vai fazer;
- Olha para o retrovisor central para ver se vem alguém atrás;
- Engata primeira marcha (ou coloca a alavanca em “Drive”);
- Solta o freio de mão;
- Verifica o retrovisor do lado direito;
- Começa a se movimentar.
Percebeu que em quase todo carro essa sequência pode ser facilmente cumprida em um movimento que vai totalmente da esquerda para a direita?
Conheço pessoas que não se importam em seguir uma sequência, mas as chances de elas saírem sem olhar no retrovisor ou esquecerem um freio de mão preso – se forem interrompidas, por exemplo – são maiores do que quem cumpre uma sequência igual toda vez.
Nem todo avião facilita ao piloto essa sequencia de ações, principalmente aqueles com painéis mais antigos cheios de aviônicos separados. Aí que entram as personalizações e melhorias. Lembre-se que criar um SOP sozinho não é recomendável por ser um processo complexo, em que devem ser pensadas várias situações (normais, anormais e de emergências) para que seja efetivo e seguro. Mas já é bem melhor do que decidir abaixar o trem de pouso cada dia em um momento diferente e certa vez esquecer-se completamente de checar se baixou e travou.
Se até agora você não se convenceu de usar o SOP em todos os voos, tenho um quarto motivo extra que talvez te convença.
Fiz esse texto porque um dos comportamentos observados pelas empresas aéreas no mundo todo buscando contratar pilotos é a aderência a SOP’s.
Você pode pensar: “quando eu for fazer uma seleção posso me ajustar e trabalhar conforme o SOP para ser aprovado”. Mas para o avaliador é muito nítida a diferença entre um piloto que está tentando cumprir um SOP e alguém que faz isso sem precisar pensar. Inclusive, quem usa o SOP regulamente não precisa pensar nisso na seleção, então essas pessoas têm mais chance de serem aprovadas porque já não vão acumular tanta carga de trabalho quanto quem está fazendo teatro.
Infelizmente, já vi “atores de SOP” que foram reprovados e atribuíram o motivo a situações tipo “o instrutor não tinha falado que era para fazer tal coisa, mas ele me reprovou por isso mesmo assim.” Pois é, será que na carga de trabalho não acabou falhando a audição?
Siga o SOP, se não por você, faça isso para ajudar todos a manterem os seguros de aeronaves mais baratos.
Bons voos!
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